sábado, 20 de março de 2010

Palavras na noite

Continuas igual. Não mudas. Uma vez mais, diante
desta noite que agora cai limpando os teus olhos,
mentes e dispões-te a expressar com palavras
aquilo que não encontra forma e escapa ao pensamento:
esta emoção que brota dentro de ti e consome
toda a tua vida, pura como um papel que arde.

E ainda que não ignores ser um trabalho inútil
deixar aqui rendida uma recordação desta noite,
que tudo isto, que agora parece eterno, acaba
sem que um poema, um gesto, o condene ou salve,

continuas igual, não mudas: sem vaidade, com medo,
vais selando a sua morte, até que chegue a alba.

José Mateos

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